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  • poder
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Influenciar quando não há poder

Revista "Marketing Farmacêutico" - Novembro/Dezembro 2019

Isabel Azevedo

Os profissionais de saúde são cada vez mais chamados a assumir responsabilidades nos âmbitos clínico e de gestão. A afetação racional e otimizada dos recursos passou para o topo das prioridades, baseando-se em modelos de análise que automatizam ou orientam as decisões. Fica menos espaço para analisar multidisciplinarmente as propostas, e é essencial ser persistente e saber influenciar, para conseguir defender a mais valia de um projeto ou de uma terapêutica nos vários patamares de decisão.

Quando o médico prescreve uma terapêutica, fá-lo no seu papel de clínico procurando uma eficácia no tratamento, mas também no papel de gestor equacionando a vertente económica das opções. Caso a sua decisão implique um investimento maior na terapêutica, o médico precisa de se assumir como advogado do doente, sabendo defender e influenciar os vários stakeholders (administração, farmácia, comissão de farmácia terapêutica, cuidadores, etc.) no sentido da sua decisão clínica. Como o sucesso da terapêutica depende da adesão por parte do doente, também aqui o médico precisa de se assumir como confidente e conselheiro, construindo com ele uma relação empática e usando a comunicação adequada para o motivar.

Esta multiplicidade de papéis exige que o profissional de saúde, e neste caso o médico, seja capaz de conquistar a adesão dos outros, constituir redes que apoiem as suas iniciativas, cativar a atenção dos stakeholders, sendo persuasivo, perseverante e consistente na defesa das suas propostas. Contudo, as capacidades que lhe permitem exercer esta liderança influenciadora, são timidamente trabalhadas no decorrer da sua formação pré-graduada. Quando o profissional é confrontado com a realidade, em contextos com regras rígidas, políticas internas limitadoras, escassez de recursos, falta de tempo, conflitos abundantes, sentindo a sua energia drenada nas pequenas lutas diárias, apercebe-se então que lhe faltam as ferramentas “para lidar com pessoas”, “conseguir-se fazer entender” ou “veicular as suas ideias”.  

Esta tomada de consciência é a oportunidade para atuar, ajudando o profissional a identificar as suas dificuldades naquele contexto concreto, e traçar com ele um plano para desenvolver as competências relevantes nos vários domínios, e que poderão catalisar e potenciar a sua atuação clínica.

Dar o primeiro passo para que as suas propostas sejam ouvidas e consideradas

Como trabalhar estas competências?

O primeiro passo tem de ser dado pelo próprio, questionando-se sobre o que é que precisa melhorar para que as suas propostas sejam ouvidas e consideradas. Por exemplo: construir a argumentação, ser capaz de identificar os verdadeiros influenciadores das decisões, construir relações com os diferentes stakeholders, negociar, comunicando assertivamente e usando uma linguagem a que sejam recetivos.

O passo seguinte consiste em traçar um plano de desenvolvimento alinhado com aquele objetivo – o que vai fazer para melhorar as suas competências, quando, como e com quem. É importante combinar vários contextos de aprendizagem optando pelos mais credíveis e também os mais motivadores para aquele profissional em concreto, dentro de um leque alargado de opções - ensino formal pós-graduado, cursos ad-hoc, experiências formativas, partilha de conhecimento, participação em projetos, programas de e-learning, livros, artigos, etc.

O terceiro passo, e fundamental, é a prática. Permitir-se enfrentar desafios que lhe são desconfortáveis, fazendo uso das ferramentas que aprendeu.  Por exemplo – apresentar uma proposta ao Diretor Clínico, ou ao Presidente do Conselho de Administração. E estar preparado para aprender com a experiência, traçar novas metas de desenvolvimento e ir assim conquistando o seu espaço de influência.

Afinal nem todos os profissionais de saúde poderão estar em posição de exercer a influência do poder, mas podem desenvolver competências para usar o seu poder de influência.

Isabel Azevedo

Consultora em comunicação e gestão de mudança