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Criar pontes nas profissões de saúde

Revista "Marketing Farmacêutico" - Setembro/Outubro 2019

Alberto Abreu da Silva

Na realidade portuguesa há um fosso entre as profissões de saúde que impede um pleno conhecimento do dia-a-dia e dos desafios que lhes são impostos, em diferentes contextos: hospitais, centros de saúde, farmácias hospitalares ou comunitárias ou o imenso mercado privado que existe na saúde, desconhecido pela maioria.

Muitos são os médicos ou enfermeiros que não têm pleno conhecimento, no hospital, da importância e valor adicional que o farmacêutico hospitalar tem no apoio à prescrição medicamentosa para doentes internados, bem como os farmacêuticos não compreendem a carga de trabalho e obrigações que os primeiros têm para garantir que todas as especificidades na orientação dos doentes são tidas em conta. De facto, poucos são os serviços em que o farmacêutico hospitalar contribui de forma ativa e participada no tratamento dos doentes.

De facto, poucos são os serviços em que o farmacêutico hospitalar contribui de forma ativa e participada no tratamento dos doentes.

Este fosso começa a ser edificado desde a formação pré-graduada, na qual a interação entre as profissões é virtualmente nula, sem oportunidades de aprendizagem em conjunto, resultando num consequente desconhecimento das competências adquiridas antes da entrada no mercado de trabalho. Já no mercado de trabalho, a hiperespecialização e segmentação de mercado das várias profissões, não cria oportunidades para colmatar esta falha, acentuando o problema.

A falta de conhecimento da realidade das diferentes profissões de saúde está apontada pela Organização Mundial de Saúde como um entrave ao progresso dos sistemas. Nomeadamente, é um dos aspetos fundamentais no desenvolvimento de prática colaborativa, ou seja, uma verdadeira colaboração entre os profissionais de saúde na prestação de cuidados. Isto implica, necessariamente, ver todos os profissionais como atores importantes na entrega de saúde à população, desde os médicos aos farmacêuticos, passando pelos fisioterapeutas e enfermeiros, entre muitos outros. O conhecimento das várias realidades, ou mais estritamente falando, clarificação de papéis dos profissionais de saúde, é uma das competências assinaladas pelo Consórcio Canadiense para a Prática Colaborativa para prestação de cuidados colaborativos. O conhecimento mútuo das competências, responsabilidades e perspetivas dos vários profissionais permite, por um lado, criar pontos de interligação de diferentes processos para objetivos comuns entre os profissionais e, por outro lado, aumentar a empatia entre eles, optimizando processos e dinâmicas já instituídas.

Como podemos então contornar esta problemática?  

  1. Instituir oportunidades de educação interprofissional nas universidades, aumentando a predisposição de colaboração e o conhecimento das várias profissões com quem contactarão no mercado de trabalho;
  2. desenvolver projetos que promovam colaboração entre as diferentes profissões, apoiados de formação e desenvolvimento de equipa que potenciem a existência de equipas verdadeiras;
  3. desenvolvimento de liderança (principalmente chefias intermédias) que promovam uma maior proximidade e contacto entre as diferentes profissões;
  4. proporcionar experiências imersivas que tenham como objetivo dar a conhecer o dia-a-dia e a realidade das diferentes profissões.

Está demonstrado que a prática colaborativa é capaz de aumentar a eficácia dos sistemas de saúde, o valor da saúde prestada pelas instituições e optimizar os recursos (principalmente humanos) dos sistemas de saúde. O repto está lançado às instituições: para podermos prestar cuidados de saúde do amanhã, temos de criar equipas do amanhã, nas quais só podem existir pontes entre as várias profissões, e não barreiras.

E para isto precisamos de líderes que promovam ativamente a prática colaborativa nas equipas de saúde do nosso país, sendo eles próprios o exemplo disso.

Alberto Abreu da Silva

Médico