São constantes as queixas de falta de colaboração entre diferentes profissionais, mas no dia-a-dia são poucas as atitudes e comportamentos introduzidos que visam alterar essa realidade.
Alberto Abreu da Silva
Num artigo prévio exploramos o impacto positivo que a prática colaborativa tem nos cuidados de saúde. Queremos unir verdadeiramente as profissões nas tarefas diárias. São constantes as queixas de falta de colaboração entre diferentes profissionais, mas no dia-a-dia são poucas as atitudes e comportamentos introduzidos que visam alterar essa realidade. Existem várias barreiras, nas quais rapidamente qualquer profissional de saúde – ou doente, que rapidamente se apercebe delas – se identifica, que contribuem para diminuir o potencial de colaboração:
O modelo do Consórcio Canadiense para a Prática Colaborativa citado no artigo anterior aponta a Liderança Colaborativa como uma das competências essenciais a desenvolver se ambicionamos uma real prática colaborativa.
Simplificando, trata-se da atitude ativa que todos os profissionais podem ter na aproximação das profissões, promovendo equidade e partilha de responsabilidade entre elas. Para mergulharmos neste assunto, gostaria de levar-vos a refletirem sobre algumas questões:
Os profissionais, para se desenvolverem como líderes colaborativos, deverão ativamente promover a elaboração de planos holísticos para o doente, desde a perspetiva médica à de fisioterapia e/ou assistência social, entre muitos outros profissionais. Promover a partilha de informação médica, de enfermagem, de fisioterapia ou social de um doente em conjunto entre diferentes profissionais não só permitirá desenhar um plano mais ajustado para o doente, como também indiretamente aproxima os profissionais, aumenta a sua confiança mútua e geração de ideias de desenvolvimento.
No dia-a-dia, o conflito interprofissional é, também, uma presença constante na vida dos profissionais de saúde, fonte de grandes desestabilizações, por vezes, com resultados também para os doentes (além dos próprios profissionais).
Quantos de nós, profissionais de saúde, nunca viraram costas a um colega de outra profissão verbalizando para nós mesmos sentimentos de revolta ou irritação?
As lideranças intermédias devem, por um lado, dar o exemplo lidando de forma positiva e construtiva com a ocorrência de conflitos entre si, e promover discussões entre os diferentes profissionais de forma respeitosa, equitativa e articulada.
Os profissionais de saúde desenvolveram-se ao nível pré-graduado e pós-graduado com poucas, ou quase nenhumas, oportunidades de educação interprofissional, ou seja, com outros profissionais de saúde, no mesmo nível enquanto formandos com expectativas de aprendizagem semelhantes. Necessariamente, os profissionais são, ao longo do seu percurso, formatados para analisarem as situações clínicas apenas e só da sua perspetiva (e muitas vezes, até, instigados a ignorar ou contrariar outras profissões).
O currículo escondido – hidden curricula – dos profissionais de saúde condiciona muito o seu afastamento e consequentemente a dificuldade de convergirem as suas ideias. Ora, os profissionais devem ter a capacidade de escutar ativamente as opiniões dos restantes colegas e tentar aglutiná-las num plano coerente e holístico.
Mas não é uma questão de tempo. Quantas vezes não se perde mais tempo em discussões circulares e sem objetivo, tempo esse que podia ser investido em colaboração? Ou quanto tempo é despendido em tarefas burocráticas, telefonemas ou deslocações no hospital, que poderia ser reduzido ou evitado se houvesse mais colaboração e interajuda?
Deixamos uma nota especial para os responsáveis pela gestão do serviço (em debate interprofissional!), que deve olhar para estas questões e encontrar metodologias que agilizem a colaboração, como por exemplo a construção de painéis de doentes de consulta/informação clínica interprofissionais, reuniões de passagem de turno conjuntas ou compatibilização de horários de turnos dentro do serviço para compatibilização de rotinas. Estas são algumas sugestões, mas idealmente estas alterações deverão ser ideias que nasçam dentro do próprio serviço.
Tanto as instituições promotoras de prática colaborativa, como nós, temos a consciência de que há um longo caminho a percorrer nesta matéria. E que existem várias adversidades nos contextos profissionais, algumas (ou muitas) impostas pelo sistema e a sua organização... Mas esperamos que com esta série de artigos possamos motivar e dotar os profissionais de ideias e energia para começar a jornada!
Alberto Abreu da Silva
Médico